Devolução de amostras de sangue indevidamente coletadas PDF Imprimir E-mail
Seg, 13 de Abril de 2015 19:50

Depois de uma década de ações judiciais e campanhas internacionais, as amostras de sangue do povo Yanomami coletadas entre os anos de 1967 e 1970 sem sua autorização, para pesquisas genéticas em laboratórios de universidades dos Estados Unidos foram repatriadas ao Brasil.

Para o povo Yanomami, o sangue coletado indevidamente representou um crime contra seus costumes tradicionais, além de atentar contra a própria Constituição brasileira. Muitos dos indígenas que tiveram material genético coletado pelos pesquisadores norte-americanos já são falecidos. O seu sangue são restos mortais que os Yanomami costumam cremar.

Os Yanomami descobriram que as amostras de sangue foram coletadas sem autorização, quando o jornalista norte-americano Patrick Tierney lançou o livro “Trevas no Eldorado”, no ano 2000. Neste livro, o jornalista denunciou que o geneticista James Van Gundia Nell e o antropólogo Napoleon Chagnon, ambos norte-americanos, coletaram mais de 12 mil amostras de sangue em cerca de 3.000 Yanomami.

 

A investigação do MPF diz que um dos objetivos de Nell e Chagnon com as amostras de sangue era de pesquisar povos que nunca tinham sido expostos à radiação artificial na Comissão de Energia Atômica dos Estados Unidos da América (AEC).

O geneticista James Van Gundia Nell morreu no ano 2000. O antropólogo Napoleon Chagnon, hoje com 76 anos, se tornou um pesquisador polêmico ao publicar diversos livros em que abordam a violência na cultura do povo Yanomami.

Recentemente, Chagon concedeu entrevista ao jornal Folha de S. Paulo em que diz ser “simpático a esse pedido” de repatriação do sangue do povo Yanomami, mas para os indígenas da etnia que vivem em território venezuelano. Na opinião de Chagnon seria “irresponsável” entregá-los a Yanomami brasileiros: “Uma tribo ficaria muito assustada de saber que seus vizinhos têm o sangue de seus ancestrais. Eles acreditam que isso poderia ser utilizado para fazer magia negra, por exemplo”, disse o antropólogo na reportagem.

Em 2002, o líder Yanomami, Davi Kopenawa expressou em uma carta para a Procuradoria Geral da República a preocupação com a não repatriação do sangue do povo indígena:

“Nosso costume é chorar os mortos, queimar corpos e destruir tudo que usaram e plantaram. Não pode sobrar nada, se não o povo fica com raiva e o pensamento não fica tranquilo. Os americanos, esses, não respeitam nosso costume, por isso queremos de volta nossos vidros de sangue e tudo que tiraram do nosso sangue para estudar”.

No dia 26 de março, o líder Davi Kopenawa Yanomami e seu filho, Dario Vitório Yanomami, receberam simbolicamente uma caixa com o material genético durante reunião em Brasília.

É na aldeia Piaú, na região do Toototobi, na fronteira do Estado do Amazonas com a Venezuela, que o povo Yanomami realizou, no dia 3 de abril a cerimônia de devolução oficial às famílias das amostras de sangue coletadas. É na aldeia que estão muitos indígenas que tiveram o sangue coletado. “Vamos fazer um grande choro. Depois, vamos enterrar essas amostras com o sangue em um buraco e tampar. Esse lugar vai se tornar sagrado pelo Povo Yanomami”, disse o líder Davi Kopenawa Yanomami.

Em artigo, a antropóloga Débora Diniz, da Universidade de Brasília (UnB), disse que o caso foi um paradigma para a ética na pesquisa com seres humanos. “O sangue Yanomami é o pano de fundo para a discussão de questões centrais sobre a participação de populações vulneráveis na pesquisa científica nas Ciências Humanas e da Saúde”, disse.

Fonte: Amazônia Real

 

Nossos parceiros