Encontro E-CHANGER 2013: caminhos da solidariedade entre Norte e Sul PDF Imprimir E-mail
Qui, 16 de Maio de 2013 12:37
A Equipe da Secoya participou do Encontro Anual da E-CHANGER 2013 que foi realizado entre os dias 6 a 10 de maio 2013 em São Luis do Maranhão, um dos estados mais pobre do Brasil e marcado por uma forte resistência popular contra os projetos da mineração, especialmente da empresa Vale do Rio Doce-SA.
O Encontro reúne mais de 30 pessoas, entre cooperatores/atrizes suíços e brasileiros e lideranças das organizações parceiras da E-CHANGER no Brasil: CAV - Centro de Agricultura Alternativa Vicente Nica, CEDECA – Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Interlagos, CMP – Central de Movimentos de Populares,  MMM – Marcha Mundial das Mulheres, MST - Movimento de Trabalhadores Rurais Sem Terra, SECOYA - Serviço e Cooperação com Povo Yanomami, SMDH – Sociedade Maranhense de Direitos Humanos e UNMP – União Nacional por Moradia Popular. Neste ano, estiveram presentes os representantes da aliança formada pela E-CHANGER, InterAgire e MBI, três agências de cooperação suíças que desde 2013 trabalham conjuntamente com o intercâmbio de pessoas.
O encontro foi iniciado com uma mística que celebrou as lutas populares de resistência e contestou as versões oficiais da história, que ocultam e tentam nos afastar de nossas raízes africanas, indígena e popular. Assim, Zumbi dos Palmares foi lembrado como verdadeiro herói da resistência contra a escravidão, em oposição à figura da princesa Isabel, que assinou no 13 de maio o decreto que deu fim oficial a esse regime de escravidão.
Cooper-atoras de E-changer que atuam na Secoya
Ao longo do encontro, foi realizada uma feira de intercâmbio entre as organizações presentes, procurando apresentar as diversas realidades vivenciadas e os atuais desafios enfrentados pelos movimentos populares no Brasil, diante de uma conjuntura de pouca abertura para o diálogo e centrada sobre o desenvolvimento econômico pauta no Programa de Aceleração do Crescimento-PAC e na Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana-IIRSA.
O Tema central do encontro voltou-se para “Os impactos da mineração”, com um debate que contou com a colaboração da Rede Justiça nos Trilhos e do Fórum Carajás, organizações que trabalham na defesa dos direitos das comunidades impactadas pela mineradora Vale do Rio Doce, eleita em 2012 como pior companhia transnacional em nível mundial em função dos graves impactos socioambientais provocados. A riqueza das informações apresentadas permitiu compreender a dimensão dos impactos sofrido pela população rural maranhense, por conta do processo avassalador de extinção da vida que, além da mineração, articula o monocultivo de soja e eucalipto, atingindo centenas de comunidades tradicionais.
A exploração das minas, situadas no estado do Pará, implica em uma cadeia que tem efeitos destruidores sobre as populações. O transporte do minério até o porto de Ponta Madeira no Maranhão é feito por uma ferrovia de 900 km que impacta cerca de 100 comunidades. Além disso, este grande projeto envolve desmatamentos, implantação de monocultivo do eucalipto, a construção de siderúrgicas e carvoarias, entre outros efeitos.
A reflexão apontou que o Grande Carajás se integra a um modelo desenvolvimentista implementado durante o final da ditadura militar e continuado por sucessivos governos, voltado para a exportação de matéria prima para o mercado externo, mas também para a construção de grandes obras que ignoram a sustentabilidade e o respeito pela vida. “Os projetos chegam com ideologia de progresso, mas tem fundo autoritário de instalação, pois desconsideram o processo de participação e de informação da população”, afirma José Vale dos Santos, ex-cooperator de E-CHANGER e atual secretário de Meio Ambiente do município de Barreirinhas (MA) que colaborou no debate.
Uma visita foi realizada a comunidade Oiteiro dos Pires, em Santa Rita/MA, diretamente atingida pela Estrada de Ferro Carajás, mineradora no município de Santa Rita (MA), com o objetivo de conhecer a realidade das famílias locais.
Em reunião, com lideranças comunitárias de vários povoados vizinhos, como Carionguinho e Cariongo, além do Retiro de São João da Mata, em Anajatuba foi possível perceber a dimensão dos impactos socioambientais causados nessa região pela estrada de ferro Carajás. População formada por lavradores e pescadores, muitos deles são hoje impedidos de realizar suas atividades, diante do avanço do latifúndio e da presença da ferrovia. Estas comunidades já bloquearam por duas vezes a linha férrea da Vale pela falta e cumprimento dos acordos estabelecidos entre a Vale e as comunidades.
Nos últimos anos houve uma redução drástica na produção de arroz, milho, mandioca e feijão, principais culturas da região, além da pesca em campos alagados. Parte da população vive apenas de benefícios sociais e programas de transferência de renda do governo federal.
A principal reivindicação dos moradores de Oiteiro, atualmente, é a construção de um viaduto que lhes garanta o direito de ir e vir, cotidianamente violado pela mineradora Vale. “Todo dia há quem esteja indo para a escola e não possa passar, ou vindo da feira, com as compras; já houve até mesmo casos de gente doente, indo para o hospital, que morreu sem conseguir passar, por que o trem não deixa”, relataram os moradores.
Entre outros problemas enfrentados, a comunidade relatou a ocorrência de doenças respiratórias, o barulho excessivo dos trens de carga, além da uso constante da buzina do trem, “que pode ser ouvida até a última comunidade”, isto é, passando de Oiteiro dos Pires.
No caminho de volta, o grupo de visitantes pode sentir na pele os transtornos sofridos diariamente pela população local: o ônibus que os conduzia ficou impedido de seguir viagem por aproximadamente meia hora, enquanto dois trens – um deles com 357 vagões e três locomotivas – se cruzavam, justo onde a comunidade requer a construção do viaduto.
O encontro foi finalizado com um balanço do Programa Brasil da E-CHANGER, com uma apresentação da forma de funcionamento, visão, objetivos e desafios para os próximos seis anos. A perspectiva é de defender o Programa no âmbito da aliança, revelando a sua especificidade e inserção nos movimentos sociais, numa perspectiva de promover mudanças tanto no norte quanto no sul.
 

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