Da selva aos agenciadores PDF Imprimir E-mail
Seg, 19 de Março de 2012 15:00

Qualquer brasileiro bem informado sabe que a Polícia Federal não tem estrutura para combater a garimpagem ilegal em terras indígenas, seja por falta de recursos ou até mesmo por falta de contingente. As operações realizadas para combater essa prática ilegal sempre necessitaram de apoio do Exército e de outras instituições.

E a liderança indígena Davi Kopenawa conhece bem essa realidade, por isso andou fazendo denúncias acusando a PF de não estar cumprindo o seu papel. Então, em vez de as autoridades brasileiras se mobilizarem para corrigir os erros, trataram de processar Kopenawa por calúnia, em uma clara atitude que tem por finalidade silenciá-lo.

Além de servidor da Funai, Davi Kopenawa é um conhecedor da realidade da Terra Indígena Yanomami, alvo principal da garimpagem na região amazônica. E ele tem sido um porta-voz histórico sobre as mazelas da ação da sociedade envolvente quando se trata de desconhecer os direitos indígenas e desrespeitar a garantia à terra pelas populações tradicionais.

A questão da garimpagem tornou-se um problema sério que deveria dispensar uma ação mais séria do governo brasileiro, em especial do Ministério da Justiça, para que fosse mudado o foco das ações da Polícia Federal.

As operações realizadas para combater a mineração sempre foram voltadas a caçar garimpeiros no meio da selva, com incursões que mais serviram para dar carona de volta a garimpeiros cansados, doentes e famintos que batalham pela sobrevivência em busca do ouro. Detonam-se algumas pistas clandestinas e queimam-se maquinários. E depois tudo volta ao esquecimento.

É preciso que o governo brasileiro passe a tratar o garimpeiro também como vítimas de um esquema maior, mantido por empresários e agenciadores de garimpos, os quais contratam esses garimpeiros em um sistema sem regras e leis, os mantendo na selva com alimentos, combustível e maquinário.

Esses pequenos garimpeiros não têm dinheiro para fazer incursões na floresta, voos para levá-los até ao local da garimpagem em locais inóspitos e abastecê-los com alimentos, muito menos para comprar maquinários. E quem banca tudo isso? Quem promove a garimpagem ilegal nas áreas indígenas?

Em vez de processar o líder indígena, o criminalizando, e de fazer operações de impactos na mídia que servem apenas para resgatar garimpeiros empobrecidos (e que passam a também responder por crime ambiental), as autoridades deveriam investigar os financiadores da garimpagem, por meio de um serviço de inteligência.

Não é difícil fazer esse mapeamento e monitoramento. As casas de venda de ouro estão aí, com suas fachadas, os serviços de rádio que se comunicam com garimpos ilegais e aeronaves que os servem estão com suas enormes antenas nos bairros da cidade. Não há nada escondido, a não ser o garimpeiro no meio da selva. É hora de mudar o foco. É possível acabar com a máfia do garimpo. Basta vontade política.

 

Fonte: Jessé Souza - Jornalista do Folha de Boa Vista.

 

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